É sábado e estamos na casa da aldeia. Eu, o meu marido e a filha F.
F ainda acompanha os Pais para todos os sítios. Gosta do que nós gostamos, frequenta os sítios que nós frequentamos e tem uma relação com a mãe (eu) de total identificação e transparência. Talvez demasiada transparência.... F não tem um único amigo da sua idade. Não me parece saudável!
O que verá uma rapariga de 23 anos numa aldeia no meio de nada, sem atracções ou interesses, apenas com o clima frio e a lareira acesa?
Hoje, o meu marido falou connosco de trivialidades e em tom suave, como se toda a tensão anterior não tivesse existido. Comportámo-nos como tem sido já habitual nos últimos anos. Sem violência, sem sentimento, sem interesse !
Pareceu-me que ele queria voltar a aproximar-se. Chegou mesmo a sugerir visitar amigos meus de quem diz horrores todos os dias... (todos os meus amigos são pessoas horríveis, apenas os amigos dele são gente interessante !)
A F não tirou o pijama em todo o dia, não lavou os dentes nem tomou duche, mas não está deprimida. Só não tem objectivos e diz estar muito cansada. Será da medicação?
Neste momento em que escrevo, estão - Pai e filha - estão a ver um filme dos Monty Python (um grupo de comediantes ingleses, já antigo). Bem sei que foram um sucesso de televisão, cinema, etc. E eles (pai e filha) estão a rir-se às gargalhadas, felicíssimos.
Mas, ainda não há10 minutos, a F estava de cara fechada, dedicada ao seu tricot e dizendo que queria ir para a cama por estar muito cansada.
Eu não caminho para nova... em breve serei uma idosa a precisar que tomem conta de mim.
A F há já 10 anos que convive com esta perturbação de Borderline, e eu tenho vistos melhorias e recaídas em questão de segundos !
E se isto se prolonga por mais 10 anos? e outros 10? Quem a ajudará?
É inteligente, mas não consegue dedicar-se o suficiente para completar a licenciatura na Faculdade. Qualquer obstáculo, por pequeno que seja, é motivo de desistência.
Estranho; pois em outras situações, que só de si dependem, ela supera provas incríveis !
Como conseguem estes doentes ultrapassar as suas dificuldades? Como se preparam para não necessitarem de apoio? Que posso eu fazer para a tornar independente? Porque desiste tão facilmente de tudo ?
Ela chamava a este tratamento ambulatório "A sua última esperança". Declarava a plenos pulmões que não iria desperdiçar esta sua última oportunidade de ficar "normal" ! E quando acorda cansada não vai????
Gostava de falar com a minha outra filha C que está no Estrangeiro. Há já 2 dias que não lhe falo. Com ela nunca comentámos muito o assunto da irmã, pois parece sentir-se preterida. Não é !
Tenho medo. Só queria fugir e esquecer tudo !!!!
Vamos lá a animar, miúda! Tem que ser !!!!
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